sexta-feira, 15 de junho de 2012

Prato do Dia: pipocas pulando livres na panela

        (Quando comecei a cozinhar esse blog, o fogão aquecia minhas pipocas que, com o calor, passavam a saltitar soltas em uma panela sem tampa. Hoje senti um cheiro de queimado. Ao checar, me deparei com uma tampa enorme cobrindo toda a panela que, além de abafar, impedia minhas ideias, digo, pipocas, de voarem livres pela cozinha)



Preciso fazer uma confissão. A ideia de fazer um blog era para meu puro e egoísmo uso. Mistake. Biiiiiig mistake. Qualquer um sabe a lei básica da escrita: a gente não escreve para nós e sim para os outros. Bom, mesmo assim, polianamente segui com meu projetinho de usá-lo para desabafar, para escrever o que penso sobre as coisas, para refletir... Escrever sem preocupação. Ser livre e espontânea com as palavras e comigo mesma. De certa forma, estava funcionando. Até agora.

Oitavo post e aqui estou eu super preocupada com as palavras, com o tema, com o texto, com tudo! Aonde foi parar minha liberdade, minha espontaneidade, meu infantil pensamento “o blog é meu e escrevo o que eu quero!”? Eles se foram quando comecei a receber retorno pelo que escrevo, quando comecei a criar vínculos com meus leitores. E aí, me dei conta de que eu não era tão livre assim para escrever o que bem quisesse. Essa "descoberta", ao mesmo tempo que me faz agora escrever mais conscientemente, acabou sufocando um pouco a liberdade da minha escrita; liberdade essa, que eu acreditava que o meu próprio blog iria me proporcionar.

Pensando além-blog, me dei conta de que a gente nunca é realmente livre. Colocou os pés para fora da cama de manhã e já dá para sentir a vibração da cobrança. Ou é a gente se cobrando ou são os outros cobrando a gente. Estamos sempre na busca por querer sermos melhores (isso quando não queremos ser “os” melhores). Mas o que vem junto com esse pacotinho chamado cobrança? Bom, além - claro - da falta de liberdade; estresse, preocupação, ansiedade, desapontamento e por aí vai.

Isso me fez lembrar um episódio da minha vida que ilustra bem essa minha (falta de) liberdade. Por muitos anos, todas as vezes em que eu saia de férias, bolinhas vermelhas, mais conhecidas como alergia, tomavam conta do meu corpo todo. O jeito era ficar em casa esperando a nada esperada volta ao trabalho. Um dia, no divã, esse assunto acabou entrando na pauta. Com a ajuda da psicanálise, descobri que minha alergia era a expressão da minha angústia em não saber lidar com o tempo livre. Bonitas palavras para uma feia conclusão: eu não sabia ser livre!

Isso me chocou, claro. Como assim, não sei ser livre? Claro que eu sei, oras! Well, após algumas-várias-muitas sessões depois, entendi que a gente só é livre mesmo dentro da nossa cacholinha. Lá, o espaço é seu e você tem total liberdade para pensar o que bem quiser (sem regras e sem cobranças!). Mas como nada é assim tão fácil, para que isso aconteça, nós temos que nos permitir sermos livres, isto é, permitir que essa liberdade interna flua naturalmente.

O que quero ressalatar é que, na verdade, na maioria da vezes, somos nós mesmos que nos cobramos tanto. E é essa cobrança toda que nos impede de ser livres. Eu tenho uma catraca dentro da minha cabeça que não deixa escapar nada! Ela fica lá, de plantão, só esperando uma nova situação acontecer para me apresentar a conta.

Atualmente tenho passado internamente por várias cobranças. Exemplifico uma delas: quando estava trabalhando, eu tinha mil idéias do que faria se tivesse meu dia todo para mim. Pedido desejado, pedido realizado. Hoje tenho todo o meu dia só para mim e o que faço? Passo o dia me cobrando por não estar trabalhando!

É uma cobrança sem fim! Mães que trabalham se cobram por passarem pouco tempo com os filhos. Vendedores se cobram por não alcançarem suas metas. Jornalistas se cobram por não terem escrito o texto perfeito. Estudantes se cobram por não terem tirado uma nota boa. Advogados se cobram por não terem ganhado a causa. Aaaargh! Alguém tem que tirar a tampa dessa panela!

Ou não. Talvez essa cobrança interna seja mesmo necessária. Talvez seja exatamente por meio dessa pressão que consigamos chegar mais perto do nosso ideal. Talvez ela seja a faixa da linha de chegada, o limite pelo qual precisemos ultrapassar. Talvez basta acrescentar um pouco mais de milho na panela e tampa nenhuma impedirá nossas pipocas de voarem livres pela cozinha (de novo!). E que venha a liberdade sem preocupação!
Karin Silvestre